Bateu no poste

Mamada!



Vi "A garota no trem" no cinema e aviso: se o Oscar não for para Emily Blunt, farei um protesto, nu, na Avenida Paulista. Mentira. Mas é fato que Blunt entrou para o hall das grandes atrizes, cuja cadeira de honra ainda é de Meryl Streep.

O filme nem é tudo isso, fica devendo ao livro, ao contrário de "Garota exemplar", suspense na mesma linha e que foi brilhantemente adaptado para as telonas por David Fincher. O que mais me chamou a atenção, porém, foi a personagem central de "A garota no trem", uma alcoólatra triste, desacreditada e suspeita de um crime brutal.

Já escrevi um par de textos sobre os constrangimentos que os bêbados podem protagonizar. Eu mesmo não escapei de alguns. Sem falar no risco à segurança. Não vou negar o prazer que um copo de cerveja gelada e um bom vinho podem proporcionar. Também gosto de tomar um Cosmopolitan de vez em quando. Aí é que mora o segredo: no "de vez em quando".

Nossa sociedade, contudo, segue embriagada com a cultura de incentivo ao consumo de álcool, sem se dar conta da dimensão do perigo. Nas redes sociais, as fotos de festas, geralmente com bebida envolvida, são as campeãs de curtidas. Há um consenso de que segurar um copo é legal, bacana, sinônimo de gente descolada, que sabe o que faz. Não sabe.

Outro dia, uma colega enfiou a fuça no poste depois de sair de um bar onde encheu a cara com a turma. Saiu gargalhando do boteco. Agora, depois do acidente, chora de dor pra dormir, ficou toda arrebentada. Está cercada de gente mamada, que fala em beber o tempo todo, em sair pra tomar uma, que discute preços de caixas de cerveja, combina o próximo porre, acha graça quando alguém passa mal e parece disputar quem tem a relação mais próxima com a divindade alcoólica a quem os mamados parecem servir.  

O Deus da cachaça, é bom que se diga, é da pá-virada e não costuma mostrar sinais de compaixão. Quer mais é ver o circo pegar fogo e deve estar rindo à toa com os mais alegres, aqueles que bebem até cair e chamam o Hugo com a cara na privada.



A publicidade se encarrega de agregar ao álcool a farra na praia e a mulher boazuda. As redes sociais promovem perfis específicos para cachaceiros, com frases mergulhadas no bom humor. E algumas garrafas são pura zombaria no próprio rótulo. Beber tem associação direta com o riso. Só que quando o corotinho passa a ser necessário a qualquer diversão, só o "AA" ou Jesus na causa.

Aí me lembrei daquela garota que fez um perfil falso e postou fotos com bebidas, para depois revelar que era alcoólatra e que não havia motivo para as milhões de curtidas. Aí me lembrei da moça que, anos atrás, se espantou quando revelei a ela que prefiro refrigerante a cerveja. Aí me lembrei de "A garota no trem", da colega que enfiou o carro no poste e de tantos outros que se acostumaram a viver entorpecidos, porque isso, para a nossa sociedade alcoolizada, é o padrão.

Não estou dizendo que sou melhor que os outros, mas daqui, do lado sóbrio da vida, tenho uma visão cinzenta dos que estão do lado de lá, com seus copos em punho. Folks, please, menos álcool, mais consciência. Pipoca, pizza, música boa, conversas saudáveis e beijo na boca, sem gosto de pinga, também são divertidos, acreditem. 

Concordo que a realidade pode ser um porre, que uma cervejinha ajuda a relaxar e a aliviar o lado assustador da sobriedade. O problema é casar com a ceva. Melhor deixar a gelada como amante, para momentos transgressores. Para os demais, que tal variar? Ao contrário do que dizem, brinde com água não dá azar. E faz bem para à saúde. 

Comentários

  1. Boa noite amigo.
    Muito bom achar uma pessoa que vive a mesma filosofia que a minha.
    Também não bebo. Já bebi e muito. Em 2007 entrei em coma alcoólico. Foi meu limite. Fiz coisas que não me lembro, falei muitas coisas que não deveria. Até andar pelado na rua eu fiz. Mas o coma apagou tudo.
    Apagou com esses atos involuntários e subconscientes. Apagou, ou melhor, sumiu com todos os meus " melhores amigos ". Parei de beber e eles sumiram.
    Eram amigos de porre. Tá bebendo, tá pagando então tô do lado. Parou? Tchau.
    Esse ano fará 10 anos que parei. Totalmente. O cheiro da cerveja me enoja. Aquela vida me envergonha.
    Prefiro um copo de refrigerante de cola bem gelado e com bastante gelo, ao invés de uma cerveja.
    Eu era casado com a cerveja. Todo dia tinha que por uma guela abaixo. Aos finais de semana, eram caixas.
    Não me arrependo de ter parado forçadamente.
    Não me arrependo dos momentos de amizade que me proporcionaram por anos.
    Me arrependo por ter gastado tanto dinheiro e hoje ando de ônibus. Kkkkk
    Abraços.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá, xará. Muito bom seu comentário aqui. Se te fazia mal, melhor mesmo cortar pela raiz. Acho que há uma supervalorização da bebida em nossa cultura, e isso não ajuda. Até gosto, vez ou outra. Mas a sobriedade sempre me pareceu mais atraente. Um abraço a vc.

      Excluir

Postar um comentário