De cabeça

Amor tetraplégico


"Adoro ver quem se joga de cabeça nos relacionamentos e sai tetraplégico". A frase, carregada de humor negro, bem que poderia ser minha. Foi postada por uma colega no Face. Imediatamente, pensei em Shania Twain. A idolatrada cantora pop-country sumiu do mapa da música exatamente por isso: se jogou de cabeça.

Shania foi traída pelo companheiro de 14 anos, e então parceiro musical, Robert "Mutt" Lange. Pior: o pivô foi a melhor amiga dela. O castelo da princesa desmoronou. Compreensível. Os discos eram feitos a quatro mãos, por marido e mulher. A fórmula do casamento aparentemente perfeito inspirou músicas encantadoras e turbinou as vendas de CDs e ingressos para os  shows. O amor, no caso de Shania, ajudou na conquista do mundo. Até que acabou.

Shania enfrentou uma violenta depressão e nunca mais lançou um hit. A voz desapareceu, lentamente, por causa de uma disfonia. Casou-se novamente, ensaiou alguns retornos, porém continua isolada. Um novo trabalho está só na promessa. Talvez na dependência de um outro grande amor, que sepulte a decepção.

Ouvir From this moment on, a mais linda canção de seu repertório, tornou-se uma experiência reveladora. A letra retrata alguém submisso ao amor, capaz de confundir a própria felicidade com a do objeto de desejo. Não a culpo. E me pergunto: seria possível amar sem se entregar? Ou pisando no freio? Quando o coração acelera, e quase sempre o faz por conta própria, dá pra brecar antes de bater? 

O clipe (dá um play ali pra cima) é de uma beleza ímpar e traz uma mensagem tocante: a busca do amor é como tentar abrir portas. Muitas estarão trancadas. De repente, uma se abre. E maravilhas acontecem. Só não se sabe até quando.

Shania viveu no mesmo mundo de casais considerados inseparáveis pelo senso comum - e que se separaram - como Cláudia Raia e Edson Celulari. Outro pilar sólido de fidelidade, a dupla Bonner e Fátima, andou passando por turbulências, segundo as más línguas. Alexandre Borges e Júlia Lemmertz, casados há muito mais tempo que o universo da TV poderia supor, também teriam enfrentado uma crise. 

O amor, afinal, sobrevive às intempéries da existência a dois? Se sobreviver, vai deixar como saldo a amizade e o respeito, descontada a paixão? O amor romântico, aquele que projetamos desde que ouvimos a história de Romeu e Julieta, vai mesmo se esvair junto com as ilusões que adoramos alimentar? 

Eis o paradoxo: a realidade de amores que inevitavelmente desmoronam é o nosso combustível para desafiar as probabilidades. A cada tentativa, renova-se a esperança de achar um tesouro. No jogo de xadrez dos relacionamentos, precisamos nos resignar diante do xeque-mate e recomeçar, devagar, peão a peão. 

A frequência das partidas, quero acreditar, nos faz mais espertos. O segredo não é se jogar de cabeça. Nem ficar paralisado, temendo um outro acidente. É dar uma ponta com classe, mergulhar no sentimento e, se for o caso, retirar-se na hora certa. Ao menos na teoria, funciona muito bem.

A ideia de dois apaixonados nadando juntos no infinito oceano dos corações partidos ainda me fascina. Já tomei um indigesto chá de realidade, porém não abro mão do romantismo que Shania me cantou com tanta convicção. Vou temperar do meu jeito, até aperfeiçoar a fórmula. Se der certo, volto para contar. Se não der, e eu sair tetraplégico, garanto: estarei feliz por ter tentado.    

Comentários

  1. Haa..olha quem está falando neh??? Sou simplesmente apaixonada por você..ops apaixonada pela sua maneira de escrever..kk Seu blog é um encando, seus textos fantásticos, passo horas por aqui e não me canso..kk Agradeço,suas visitas ao meu blog, seus comentários me estimulam a seguir escrevendo, embora confesse a vc que por diversos momentos tenho pensado em simplesmente abolir essa ideia besta de continuar escrevendo,(deve alguma espécie de crise existencial..kk)
    Eu que agradeço sua atenção comigo, e espero contar com sua presença sempre me fazendo sorrir com seus cmentários lindos!
    Obrigada!

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  2. Quantos a relacionamentos que nos deixam tetraplégicos, constumo dizer que eles são inevitáveis e estimulantes, afinal não deixaria de arriscar conhecer alguém por medo de me machucar e se é invitável o acidente final, sou persistente na reabilitação, se não posso mais me mover como antes, arrumo outros meios para seguir a vida, faço algumas adaptações, e é claro que não vou me privar de um novo romance, mesmo sabendo que ele me trará novas sequelas...
    Enfim,é um ciclo... interminável.. mas indispensável, pelo menos para mim.
    Beijos Rodrigo

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  3. Natasha, se você parar de escrever, eu te mato! Rsrsrs. Eu te entendo, tem hora que dá vontade de parar mesmo, mas não faça isso! É só o começo de uma trajetória brilhante. Estarei sempre por lá para te prestigiar, afinal são textos de uma qualidade rara. Bjos e volte sempre, viu?

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  4. Rodrigooooooo, tem uma cadeira de rodas ai pra me emprestar? Putz...acho que emprestar não...nunca mais vou andar...tô achando isso...hum...

    Amar de verdade, sem redes protetoras, sem grades é fatal. No meu caso,4.8 de puro romantismo e poesia pré-menopáusica, é difícil recuperar os movimentos. Só Jesus na minha causa kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk beijo, coisa linda e inteligente demais!!!

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  5. Que honra ter você por aqui, Maria Tereza! Estou tentando deixar minhas redes protetoras bem firmes neste momento, rsrs. Quanto a você, pelo amor de Deus, hein! Está super nova, mocinha, em tempo de recuperar todos os movimentos que quiser. Já assistiu ao filme "Simplesmente Complicado", com a Meryl Streep? Tá certo que é um filme, mas acredito que o amor, para acontecer, não escolhe tempo nem idade. Sempre é tempo de recomeçar com sabedoria, seja lá o que tiver em mente!
    Sou seu fã, e obrigadíssimo pela visita e pelos elogios. Bjos e abraços.

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  6. Tive quatro motos. Caí das quatro. Desisti pra sempre da minha carreira de motociclista. Com o amor foi parecido. Muitos tombos, muitas fraturas e uma vontade imensa de desistir. Cheguei a pensar que não tinha nascido pra isso. Ia engatar uma carreira a lá Ronaldinho Gaúcho, com muita noitada, muita pegada e nenhum compromisso. Era a minha sina. Pelo menos acreditava firmemente nisso.
    De todos os enganos da nossa vida, o amor, muitas vezes, é o maior e o mais gostoso deles.

    Sem congtar que é o único caso em que adoramos descobrir que erramos. Nosso corpo é uma máquina que, ao contrário das convencionais, foi feita para ser gasta, usada ao extremo. Nosso coração, diferente do que imaginamos, foi feito pra ser partido, partido e partido. Assim, todo quebrado, ele serve para testar quem terá a capacidade de montá-lo de novo com mais perfeição. Quando isso acontece, temos a pessoa escolhida. Não por nós, mas pelo destino.

    Apesar do histórico de fraturas, sou o homem mais feliz do mundo, pela primeira vez. Se é pra sempre eu não sei, mas acreditar que é já vale a minha existência.

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  7. Conhecendo você e a Ju, tenho a exata noção do que está falando. Quando encontramos o amor, é mesmo maravilhoso, e sempre acreditamos ser para sempre. No caso de vocês, arrisco a dizer que é mesmo. Já te falei: se você não se casar com ela, eu me caso! Rsrsrs.
    Obrigado, Ricardo, por mais um comentário memorável. Um abraço, irmão!

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  8. nossa, eu não acredito!

    coitadinha!

    será que não foi depois da traição que ela escreveu 'that don't impress me much' e aquelas musiquinhas mais feministas?

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  9. Lívia, a traição foi descoberta alguns anos depois dessa música, composta em parceria com o então marido. A letra fala sobre não se conformar com qualquer um. Hoje, certamente, ela deve ouvir e cantar essa faixa de um jeito bem diferente. Obrigado pela visita. Bjos.

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