BBB

Orgulho e Preconceito


Escola para gays. Vi a matéria de madrugada, na TV. Em Campinas, uma “bee” (termo que as próprias bichas, com todo o respeito, usam para se referir umas às outras) resolveu abrir inscrição para meninos delicados que querem aprender truques de maquiagem, dança e outras manifestações artísticas. Todas as vagas estão preenchidas e há lista de espera. Está lançada a polêmica. O separatismo é a saída para aprender a lidar com as diferenças? As mesmas “bees” que desfilam na Parada Gay agora se rendem à tentação da reclusão segura?
A escola para gays é a antítese da décima edição do BBB. Ou deveria ser. Misturaram ali loiras aguadas, morenas safadas, musculosos sem tutano, bibas engraçadas, uma doutora e fecharam a porta. O resultado é delicioso para o espectador que torce pelo barraco. Ironicamente, a casa, semana a semana, se dividiu. As tribos, cada vez mais, se fecharam. Os afins se aproximaram. Resta agora derrubar as barreiras e encarar o ardiloso desafio da convivência. Se o BBB pretende representar com fidelidade uma célula do todo, então a escola para as “bees” não parece mais uma ideia tão tosca.
No BBB, torço para o Dourado. Foi com certo sofrimento que defini meu voto. Achava o sujeito um troglodita. Porco, com um corpo meio esquisito, cara de bicho atropelado e o preconceito escorrendo pelo canto da boca. Hoje, dou minha mão à palmatória. Dourado, mesmo com toda a sua canastrice, se revelou o brother mais autêntico e disposto.
No começo, o Dicésar era meu predileto. Primeira drag queen do país a participar de um reality show, postura digna, feio de doer, língua presa, divertido, do bem. De repente, numa conversa à beira da piscina com Angélica, a lésbica mais feminina do Brasil, Dicésar concordou que, se tivesse escolha, seria hétero. Porque a vida dos heterossexuais, segundo ele, é muito mais fácil. Assim, usando poucas e equivocadas palavras, Dicésar negou a própria essência e frustrou a “bee” iludida com o ideal de paridade. É como se um negro tivesse declarado em rede nacional que, se pudesse optar, seria branco. O cúmulo do preconceito internalizado. Gay com esse discurso é mais maléfico que o Dourado dando show de machismo. Angélica, por ter balizado declaração tão paradoxal, também é carta fora do meu baralho.
Decepção
A doutora Elenita, com seu intelecto pulsante e as coxas mais grossas da casa, prometia ser uma surpresa num programa que costuma ser povoado por beldades acéfalas. Pois a moça, que pena, é um tiro pela culatra. Dona de comentários arrogantes, ela prova que ter muito conhecimento, quando se está confinado, de pouco adianta. Principalmente se falta inteligência emocional. Elenita, que se orgulha da cabeça e despreza o próprio corpo gordo, é um universo de contradições que eu dispenso.
Sobra quem? O insosso do Michel? A dançarina Lia, com seu corpo incrível e a necessidade latente de provar que é 100% honesta? A insossa Fernanda, com seu belo sorriso e nada mais? Cacau, a ribeirãopretana que é um arraso maquiada, passa batido de cara lavada e pegou o musculoso tagarela do Eliéser? Cadu, que parece o Brutus, mas não fede nem cheira? Maroca, que fala num idioma peculiar, perto do infantil, e parece ora filha da Ivete Sangalo, ora irmã da Britney Spears? Tem ainda o Serginho, que faz o afetado simpático, fumante inveterado, magricela sem sex appeal e que se notabiliza mais por tirar a sunga (como se alguém estivesse interessado no conteúdo) do que pela personalidade descolada.
Enfim, voltamos ao Dourado. Assim como o Bambam, vencedor da primeira edição do Big Brother, Dourado não tem vergonha de passar atestado de incompetência e ignorância. Grita seu orgulho hétero em cada porqueira no banheiro, em cada comentário chulo, em cada pedido de desculpas quando percebe que ofendeu alguém. Vota em quem o ameaça ou não gosta dele, o que é, no mínimo, uma demonstração de bom senso. Desenvolveu uma estranha, porém terna, relação de tolerância com os coloridos, justamente os que deveriam incomodá-lo mais. Por instinto, descobriu que as alianças e o jogo de cintura se traduzem em liderança.
Ao contrário do Dourado, de quem eu não esperava nada, as bibas do BBB me decepcionaram. Não só porque contribuem com o estereótipo equivocado de que todo gay é uma moça, mas principalmente por desperdiçarem a oportunidade de fazer diferente, de mostrar que ser gay é tão difícil, ou fácil, como ser hétero, branco, negro, mulher, homem, humano. Somos o que somos. Podemos nos aperfeiçoar, nos tornar versões melhores de nós mesmos. A essência, contudo, é a mesma. Dourado não tem vergonha da essência dele. Dicésar tem. Mesmo sem perceber. Escola para o Dicésar. Para o Dourado, não. O troglodita aprendeu a aceitar as “bees” por perto, sem muros. Porque assim é a vida.
**Nota do autor
Dourado levou o BBB. Como disse o Bial, estava escrito. Seja lá o que isso signifique.

Comentários

  1. E quem também precisa aprender a aceitar essas "bees" por perto "tudo junto misturado" é o Governo do Estado de São Paulo que, neste caso da escola para os gays que vivem de tipo de maquiagem e tamanho de peruca ideal, investiu R$ 180 mil nesta Gaiola das Loucas, mais um tipo gaiola incentivada na sociedade.

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  2. Acho o Dourado muito esperto...sua relação de tolerância é altamente falsa...mas engana bem. Pode vencer, sem dúvida. O meu favorito é o Dicésar...não sabia desse comentário, mas o analiso de uma forma diferente da sua. Ele não tem vergonha da essência dele, mas quando disse isso, talvez estivesse se referindo ao preconceito que enfrenta diariamente...deve ser realmente muito difícil não ser hétero...não ser a maioria...o diferente ainda assusta, e ainda não é respeitado da maneira que deveria ser. Penso assim.
    Ah...Anamara é filha de Ivete e irmã da Sandra Bullock...rs. Bjão...Luciana.

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  3. oi sigo, adorei seu comentário sobre o BBB!! Muito interessante e engraçado, gostoso de ler, adoro!!!!

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  4. A tal escola me deixa uma dúvida: como é feita a identificação, a prova, o vestibular para saber se o interessado é "bee"?!
    Se um "hetero" quiser aprender maquiagem está proibido?!
    BBB 10: e o Michel?!
    Abs., João

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  5. Rsrsrsrsrs... João, dúvida cruel essa da escola. Sobre o Michel, de tão insosso, tinha me esquecido dele no texto. Falha corrigida. Má, Lu e Siga, brigadão pelos coments. Abraço a todos.

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  6. Na realidade, ali, um quer aparecer mais que o outro. Claro, todos querem o prêmio.
    Não tenho opinião formada sobre meu favorito, ainda não consegui definir o menos pior... rs

    Em relação aos "bees", isso falando de maneira geral (nem só de BBB), eles mesmos se colocam como diferentes, e não são.
    O preconceito ainda existe, todos sabem...
    Só que sou da opinião que nem todo mundo gosta ou é obrigado a suportar ao lado um ser escandalosamente espalhafatoso como aquele Serginho, que mais parece uma siriema com gel... afff.
    Tenho amigos homossexuais, mas em nada parecidos com aquilo. São muito discretos, inclusive para falar sobre assuntos relacionados à sexualidade mesmo...
    E eu não encararia isso como preconceito da minha parte. Um homossexual pode e deve ser como qualquer outro alguém, no entanto, a primeira pessoa a ter consciência disso deve ser ele mesmo.
    Quanto à Angélica, não posso dizer nada em relação ao jogo ali dentro da casa, mas algo que me chama atenção é realmente o fato de ela “ser a lésbica mais feminina”... rs como vc disse. É muito na dela... Ou é discreta mesmo ou não é lésbica coisa nenhuma...
    É isso! Complexo demais...
    Bjs, Rodrigo

    Sobre a nota do autor:
    Aquela elenita estava acabando com a classe... Uma doutora em LINGUÍSTICA fazendo aquele papel?!! Demorou mesmo... rs

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  7. Adoooro!
    (Que saudade gigantesca, Ro. Que tal um passeio e uma visita na nossa casa nova em Rio Preto? Hum, hum?)
    Beijos

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