São Paulo

Doce ilusão
Finalmente, conheci a sede da empresa jornalística para a qual trabalho há quase três anos. Fica em São Paulo, a “terra das oportunidades”, sonho de muitos profissionais que enxergam nela o símbolo da realização, do status, da vitória. Estar em São Paulo, não importa a condição, se transformou em sinônimo de vencer na vida. Não para mim. Por mais que eu ouça de muita gente que meu lugar é na capital paulista, atrás de uma bancada em rede nacional, insisto na idéia de que já venci, sem precisar dessa ilusão.
Na noite anterior ao meu embarque, assisti a um episódio de “Aline”, série global que vende São Paulo numa embalagem mentirosa. Com texto bem cuidado, edição caprichada, humor inteligente e bons atores, o programa tenta convencer de que São Paulo não é apenas o centro financeiro do Brasil, mas principalmente o lugar onde as coisas acontecem. É como se o país ao redor se apagasse. Não é bem assim. A escolha do Rio para a sede das Olimpíadas de 2016 é mais um indício de que o mundo acontece, e como, fora de Sampa. Viu, “Aline”?
Acho São Paulo horrorosa. Kassab que me perdoe. Noto progressos, como o Terminal Rodoviário do Tietê, que parece um aeroporto. No geral, São Paulo tem cara de terceiro mundo. É suja, cinza, com gente espremida nos ônibus e metrôs. Na entrada, favelas prestes a deslizar dão as boas-vindas. Tudo é muito longe. Os congestionamentos não ajudam. Tem quem leve duas horas para chegar ao trabalho. São Paulo não é normal. No pior sentido.
Há, sim, lugares charmosos. A Avenida Paulista é o cartão postal do capitalismo bem-sucedido, com todos aqueles arranha-céus, os semáforos e a multidão constante. Fora também alguns parques e shoppings – inclusive um para a classe A que permite a circulação dos cachorrinhos das madames - , São Paulo não tem nada demais. Até os “points” mais badalados são basicamente os mesmos, onde você encontra quase sempre as mesmas pessoas. Talvez a única vantagem seja a falsa sensação de anonimato. Em São Paulo, cada um cuida da sua vida. Uma conseqüência da frieza e da robotização. Só lá é possível estar perto de tanta gente e tão longe ao mesmo tempo. Dificilmente se consegue um sorriso, um cumprimento, calor humano, exceto quando alguém dá lugar a um idoso ou deficiente no transporte público. Um cavalheirismo determinado pela lei. Que se traduz, portanto, em solidão. Inevitável.
Em São Paulo, a permanência só se justifica por um bom salário. O que quase ninguém consegue. Só assim é possível negociar a falta de qualidade de vida. Fiquei hospedado na casa de um amigo que não se cansa de reclamar da grana curta, do estresse e da vontade de dar o fora dali. Bem ele, que mora perto do trabalho, ganha bem e vive num apartamento bacaninha. Tudo isso, claro, tem um preço. Um preço que, pelo visto, não vale a pena.
Mesmo assim, enquanto eu circulava por estúdios e redações, ouvi muita gente se gabar por viver em meio àquele caos. A certa altura, um rapazote, que mal saiu dos bancos da faculdade, argumentava de boca cheia que Santo André, onde ele mora, fica na Grande São Paulo, e não no interior. Como se viver aqui fosse um desabono, um fardo, um atraso.
Reconheço que, em muitas cidades menores, há poucas chances de crescimento profissional. E alguns avanços, de fato, demoram a chegar. Mas como bom e orgulhoso interiorano, bato no peito e digo: não posso reclamar. Pelo contrário. Nossa região é privilegiada. Tem defeitos, mas aqui consegui tudo o que precisava para seguir adiante: boa educação, segurança, emprego e tranquilidade. Além disso, Franca e Ribeirão Preto são notórias pelo desenvolvimento e sólida economia. Temos excelentes escolas e universidades ao redor. Ar mais puro para respirar. E boas oportunidades, se soubermos aproveitá-las.
Chegando em Ribeirão, pude perceber como a cidade, apesar do calor que beira o insuportável, é bonita, imponente, agradável e atraente. Fico com a Califórnia Brasileira. Me orgulho de viver longe daquela bagunça que todo mundo confunde com glamour. Sou mil vezes a Dárcy Vera. Coitado do Kassab. Palmas para ele, porque não deve ser fácil.
Podemos ainda desfrutar de outras vantagens. Nos shoppings, não tem cachorro circulando pelos corredores. Um luxo ridículo que, com a graça do bom senso, não vamos importar. Só falta mesmo uma loja daquela rede especializada em cafés. Nisso, São Paulo dá de dez na gente. Só nisso.

Comentários

  1. Achei muito interessante seu último texto...pois me identifiquei muito. Acho que deu pra ficar claro que São Paulo é a cidade que as coisas acontecem, PARA ALGUNS. Assim como em Salvador, onde as pessoas dizem que é uma cidade de gente alegre, hospitaleira, energia positiva...eu, particularmente, achei o oposto. Cidade suja, de uma energia negativa, tanto que se alguém me comprar as passagens de ida e volta pra lá...eu não aceito. Acho que cada um tem o direito de achar o que quiser de qualquer cidade, o que não é certo é impor a todos uma única imagem...muitas vezes ilusória, e tanto é verdade que é ilusória que já faz tempo que a maioria dos programas dominicais tem aquele quadro "De volta pra minha terra", ou "Revendo a família", isso pra não colocarem o título exato "Se arrependimento matasse...", rs. Luciana.

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  2. Acho que não se trata de doce ilusão, mas de objetivo e, principalmente, gosto.

    Tem gente que ama SP. Que xinga, xinga, mas quando sai de lá uma semana fica louco pra voltar.

    Conheço um cara que odeia Ribeirão.

    Eu não morro de amores por Franca.

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